Ministra, de forma breve, contextualize o antes e o depois da Revolução Cidadã.
É importante conhecer o processo para compararmos o antes e o depois de
2006 e 2007. Naqueles anos o Equador havia tocado o fundo do poço com a
aplicação do modelo neoliberal, que privilegiou os interesses do sistema
financeiro e socializou as perdas da crise bancária com todo o seu
povo. Dolarizou-se a economia, gerando impactos desastrosos para a
grande maioria dos equatorianos, gerando o êxodo de milhões de pessoas
como migrantes, que tiveram de buscar condições de vida fora, já que o
país não lhes oferecia esta oportunidade.
Milhares de aposentados viram diminuir enormemente seus benefícios pela
dolarização e houve até gente que se suicidou porque perdeu todos os
seus depósitos nos bancos. Creio que a crise bancária colocou destampou
uma velha institucionalidade: a de que o Estado estava absoluta e
cinicamente a serviço de pequenos grupos de poder econômico e político.
De aí surgiu a tese defendida pelo jovem Ministro da Economia e logo
candidato a presidente, Rafael Correa, de que devíamos caminhar para uma
Constituinte com o objetivo de refundar o país. Correa visibilizou que
não havia condições do povo equatoriano fazer as transformações que
necessitava dentro de um marco da velha Constituição, pois ela
privilegiava o modelo neoliberal e estava claramente a serviço dos
bancos. A lei era feita para eles, para assegurar seus lucros. A
Assembleia servia a eles e as entidades, como o poder eleitoral, também.
Tudo estava a serviço da “partidocracia”, termo que foi cunhado para
designar esse velho sistema de partidos que abarcava todo tipo de
interesses minoritários e particulares da sociedade, gerando a enorme
exclusão da grande maioria. Isso explica também o alto índice de pobreza
que herdamos: quase 40% de pobreza e 17% de pobreza extrema. Números
que temos revertido nos últimos seis anos.
Virando o jogo
Em 2007 Correa não apresenta candidatos à Assembleia porque dizia que,
naquele parlamento, não havia sentido, pois sob essas regras do jogo não
se conseguiria realizar os avanços que o povo precisava. Assim,
defendia, vamos à Constituinte. Esta foi a tese central deste jovem
movimento político Alianza País, que agrupou o melhor dos movimentos
sociais, da esquerda e de um movimento cidadão totalmente inconformado
com esse sistema.
Em 2008, 83% da população votou para que houvesse a Assembleia
Constituinte e este foi o nosso primeiro grande triunfo. Uma
demonstração de que nossas propostas estavam absolutamente sintonizadas
com o anseio popular.
Construímos a nova Constituição, a qual precisamos dar a importância
estratégica que tem. Ela é uma rota de longo alento para construir esse
horizonte compartilhado, um novo consenso social. O país que queremos,
com outro modelo de desenvolvimento, se cunhou com um termo tão lindo,
tão sugestivo que vem dos povos indígenas: Bom Viver, (Buen Vivir) que é
muito mais que crescimento econômico: é o equilíbrio entre o bem-estar
material e o desenvolvimento pleno da vida de todos num horizonte de
bem-comum. Logo depois vamos ao segundo processo eleitoral, já com as
novas regras do jogo, em 2009, quando ganha também o presidente Correa.
Não tivemos neste momento uma assembleia 100% favorável, majoritária,
daí que tivemos de 2009 a 2013 problemas de obstrução, problemas
inclusive de lógicas conspirativas, como foi o 30 de setembro, onde um
setor de oposição da Assembleia se aliou aos policiais insurretos para
por fim ao processo de mudanças de forma totalmente antidemocrática, mas
felizmente não conseguiram.
Quero repetir: A força deste projeto é a força do apoio popular. O apoio
de um povo cada vez mais maduro, mais consciente, que vem passando do
desespero à esperança, da desconfiança à confiança em si mesmo. Acredito
que agem mal os que, desde fora, veem este processo, como estampam as
notícias, como obra de um grande caudilho. Rafael Correa é um líder
excepcional, sem dúvida. É um líder de uma esquerda moderna, que não só
virou o tabuleiro da direita, da velha política, como o da esquerda
ortodoxa, tradicional, fazendo uma proposta muito coerente com o que o
povo aspira, mas também com um manejo estratégico do Estado, da política
social, da política econômica, das relações internacionais.
Mudanças democráticas, dentro do marco constitucional.
Um dos êxitos da Revolução Cidadã é não sair da rota da Constituição e,
contra vento e maré, enfrentando todas as dificuldades, materializar
esse novo marco constitucional. Essa coerência é a capacidade de
cimentar com fatos o que temos proposto, concretizando tudo o que
dizemos em termos de políticas sociais: educação e saúde públicas,
moradias sociais, política para os migrantes. São ações que configuram
uma aposta desde a área social para gerar oportunidades. Esta é a chave
para combater a pobreza. Não são dádivas.
O “bônus do desenvolvimento humano”, por exemplo, é uma alavanca para
gerar oportunidade para o povo equatoriano, para as comunidades, para os
mais pobres. Além disso, há também um bom manejo econômico das relações
internacionais baseado na soberania. Havia uma série de maus augúrios
quando o presidente decidiu renegociar os contratos petroleiros. Se o
petróleo continuasse subindo de preço, o aumento do lucro seria para as
empresas estrangeiras.
O presidente reviu isso e passamos a utilizar contratos de prestação de
serviços, pelos quais pagamos o que temos de pagar pela exploração do
petróleo. Porém as altas e os benefícios adicionais devem ir todas para o
povo equatoriano. Diziam que não íamos conseguir isso, que todas as
empresas petrolíferas sairiam do país. Pois elas ficaram e agora temos
uma relação mais justa onde o grosso dos benefícios do petróleo está
financiando a política social. Este é um olhar histórico, panorâmico,
que explicaria o resultado desta nova eleição onde tivemos uma
ratificação contundente desta confiança do povo equatoriano em Rafael
Correa, na proposta da Revolução Cidadã, e eu diria em si mesmo. Porque
para além das escolas, rodovias e hospitais, este é um crescimento da
autoestima e da confiança dos equatorianos, de que somos capazes de
dirigir o nosso próprio destino.
Houve uma enorme multiplicação dos investimentos do Estado,
particularmente nas áreas sociais. De que forma a luta política garantiu
que este seja mais do que o êxito de uma política de governo, mas de
uma política de Estado?
A própria Constituição estabelece prioridades para o Orçamento:
investimentos em saúde, educação, nos setores sociais - se destina 25%
do Orçamento a todas estas áreas. Mas, além disso, é um tema de
políticas públicas, de racionalização e bom investimento dos recursos do
Estado. Antes de 2007, boa parte dos recursos do Estado era direcionada
ao pagamento da dívida externa. Este é um ponto muito importante. O
presidente nomeou uma comissão de auditoria da dívida externa que
determinou o que, de alguma forma, sabíamos, mas que nos deu muito mais
certeza: a dívida estava praticamente paga e muito desta dívida era
ilegal e imoral.
Isso nos deu a base técnica e política para renegociar e para comprar
parte desta dívida e aliviar a carga orçamentária que tínhamos
comprometida.
O Equador foi pioneiro e sem medo nesta questão da auditoria. Essa força
moral tinha claro de que o primeiro que tínhamos de fazer era colocar
os recursos do país para saldar a dívida histórica com o nosso povo. E
temos investido nisso, incrementando em mais de 300% os investimentos em
educação.
As escolas do nosso país caiam aos pedaços. A chamada escola pública e
gratuita simplesmente não existia. Todos os pais de família tinham que
dar, no mínimo, a chamada “quota voluntária” de 20 dólares para a
matrícula. Logo, tinham que investir nos uniformes escolares, nos
livros, apostilas, e tudo era cobrado na escola pública. Para um lar
pobre, com dois ou três filhos, era impossível matricular os filhos,
porque uma família que vive com 200 ou 300 dólares não podia assumir
este tipo de gastos de mais de 100 dólares mensais para a educação.
Havia um grande contingente de crianças fora da escola...
Havia muitíssimas crianças fora da escola. Hoje já cumprimos o Objetivo
do Milênio para a educação básica e universal, com equidade de gênero:
praticamente 100% dos meninos e meninas estão estudando. Mas garantir a
gratuidade e a qualidade da educação pública não é tão fácil. Para isso
houve a valorização e a dignificação da atividade docente. Antes os
professores ganhavam 300 dólares, quando muito. Hoje o
professor que recebe menos, aquele que recém ingressa na carreira
docente, ganha 700 dólares, recebe capacitação e é avaliado
periodicamente para assegurar a evolução do nível e da qualidade.
Aprovamos na Assembleia uma nova lei de educação, intercultural, que
permite também ganharmos em eficiência e excelência com a aplicação de
todos os princípios da educação pública.
Como são as Escolas do Milênio, um dos carros-chefes da campanha.
Temos um modelo das escolas do milênio que o presidente iniciou nas
zonas de maior pobreza. São escolas com tecnologia de ponta,
computadores e internet, que podem ser vistas numa comunidade indígena
ou num bairro periférico de Guayaquil. É uma iniciativa com a qual
começamos a pagar a dívida histórica com os mais pobres. O país está
sendo semeado de Escolas do Milênio, de bons colégios públicos e já
temos também cerca de 14% de crianças de lares que receberam o bônus da
pobreza, de lugares pobres, aprovadas nas melhores universidades do
país. Temos feito uma boa mudança na educação superior conscientes de
que apostar no talento humano, apostar na formação do povo equatoriano é
a chave para o desenvolvimento. Não temos como pensar o desenvolvimento
sem uma educação pública de qualidade, de excelência. Esta é uma rota
que está muito bem traçada.
O que também pode se comprovar na questão da saúde pública.
Sim, o mesmo acontece na saúde. Os hospitais caiam aos pedaços. O
enfermo que precisava ser hospitalizado tinha de levar a seringa, o gás e
o medicamento, porque a linha neoliberal era a privatização total da
saúde, o que excluía milhões de equatorianos do serviço de atenção
pública. Junto com a Seguridade Social, os hospitais do Ministério da
Saúde são cada vez melhores.
Estamos também tapando os buracos históricos de um modelo
territorializado que começa com o nível básico. Recuperamos o conceito
de médico da família, com subcentros nos bairros para a medicina de
atenção primária, a medicina preventiva, além de hospitais
especializados da mais alta qualidade. Por isso alguns serviços públicos
estão colapsados pelo crescimento da procura, porque hoje as pessoas
estão buscando o serviço público. Há portanto uma recuperação
significativa do público como sinônimo de qualidade, como sinônimo do
direito que temos cada um dos equatorianos a estes serviços.
Os 100 maiores êxitos da Revolução Cidadã foram sintetizados num
pequeno livro em que compara o antes e o depois do governo de Rafael
Correa. O que consideras mais importante?
Poderia citar nesta pequena síntese das 100 conquistas da nossa
revolução o investimento forte em moradias sociais, construímos mais de
200 mil, número que supera a todos os últimos governos juntos. Também
para resolver o déficit em infraestrutura, houve investimento junto aos
governos locais em água potável, saneamento, serviços básicos... E
projetamos que o país possa fechar as brechas para as necessidades
básicas insatisfeitas até 2021, se seguir mantendo este ritmo de
investimento em políticas sociais, o que significaria baixar em 20
pontos a pobreza.
Devemos ressaltar que a pobreza se mede por necessidades básicas
insatisfeitas, carência de moradias, serviços básicos, educação, saúde. A
outra forma de medir a pobreza é pelos salários. Esta é uma grande
conquista que o presidente sempre destaca com justa razão: não é que
diminuímos a pobreza com bônus ou medidas assistenciais, vamos
diminuindo com redistribuição dos recursos, diminuindo a desigualdade e
gerando oportunidades, que é o que assegura um país focado em políticas
públicas voltadas ao bem comum e não para pequenos grupos.
Houve uma arrasadora vitória do Alianza País no exterior, por conta
da política para os migrantes, setor historicamente marginalizado. Fale
um pouco sobre esta ação.
Um dos compromissos do presidente Rafael Correa foi reivindicar os
direitos de nossos milhões de compatriotas equatorianos que saíram
quando houve o êxodo econômico e tivemos a pior crise da nossa história,
quando se deu a sabotagem bancária, quando muitos perderam não somente
seus empregos, mas suas economias e qualquer perspectiva de vida num
país tão mal governado por elites corruptas que tudo lhes negava.
Iniciamos com a criação da Secretaria do Migrante que é um ente
especializado que vinculou todas estas comunidades. Temos uma longa
migração nos Estados Unidos e na Europa, e também na América Latina, na
Venezuela e no Chile. Nosso capital humano na área de saúde, médicos e
enfermeiras foram para o Chile e a Argentina, países que absorviam esta
mão de obra qualificada, porque o Equador lhes negava a possibilidade de
uma vida digna.
Muitos jovens saiam e não regressavam. Então através da secretaria do
Migrante começamos a proteger seus direitos nos países em que haviam
migrado e propor um debate de alcance internacional: o mundo está
vivendo um momento de globalização e se debate seus prós e contras. Até
agora ela está muito marcada pelo capital, por servir aos interesses do
capital transnacional, voltada para os mercados, não é uma globalização
que garante direitos universais aos cidadãos, como a livre mobilidade.
Pelo contrário, nossas comunidades têm sido afetadas por políticas
migratórias adversas, em muitos casos nos Estados Unidos e Europa. E
nisso o presidente Correa também tem sido muito coerente: o Equador
suprimiu as visas dos estrangeiros. Somos o país da América Latina que
mais refugiados acolheu: particularmente colombianos, peruanos, e temos
uma política dentro do nosso país favorável a este conceito de ver a
mobilidade humana como um direito universal das pessoas. Isso tem nos
permitido colocar esse debate nos círculos internacionais.
Esta política de inclusão e de direitos aos migrantes tem dado
autoridade ao Equador para colocar o tema na agenda internacional.
Isso é certo: tem nos dado mais autoridade. Garantir a seguridade social
dos migrantes, que aqueles que contribuíram em outros países - e temos
um convênio com a Espanha – que sirva para que quando regressem esses
direitos sociais sejam reconhecidos aqui.
O direito a voltar com equipamentos básicos, o direito a voltar com
empreendimentos produtivos... Com o passar dos anos estruturamos uma
chancelaria que não é mais um conjunto de escritórios de relações
internacionais, muitas vezes burocratizada, mas bastante ligadas às
pessoas, prestando bom serviço, mantendo os migrantes bem próximos ao
governo cidadão que pretendemos ser. Isso nos dá muito respaldo na
comunidade migrante. Além disso temos negociado com os países de destino
estas políticas mais favoráveis.
Como a crise internacional, particularmente na Europa, tem afetado esta política?
No caso da Europa, a crise evidencia a falência de Estados que permitem
que as regras do jogo impostas pelo capital financeiro se sobreponham,
como é o caso da Espanha. Nossos migrantes que saíram fugindo
precisamente disso, hoje em dia dizem: vale a pena regressar. O país
voltou a nos dar esperança, há oportunidades para muitos empreendimentos
em diversas áreas, particularmente em economia popular e solidária.
Este é um tema que trabalhamos neste Ministério de Inclusão Econômica e
Social: turismo comunitário, gastronomia, serviços, estimulando os
negócios dos equatorianos que regressam. Mas há também uma recuperação
do talento humano. Muitos jovens formados no exterior, PhDs, cientistas e
técnicos da mais alta qualidade estão voltando porque creem no sonho
equatoriano. Não é mais no sonho americano, como dizíamos, o sonho que
lhes seduz, mas voltar à Pátria que recuperou a dignidade e as
oportunidades, que queremos para todos.
A questão da migração é realmente dolorosa...
Não há um equatoriano que não tenha pelo menos um familiar no exterior.
Todos temos porque vimos esta sangria do talento humano, das nossas
famílias, quando a crise bancária foi tão impactante na economia, mas
também na credibilidade. Pensem vocês que credibilidade poderia ter
partidos como o de Mahuad, que haviam sido financiados pelos bancos, e
que fizeram sua campanha pelos bancos. Claro que quando estiveram no
poder lhes devolveram esse favor com a sabotagem bancária, que pagou as
perdas dos banqueiros com os recursos de todos os equatorianos. Esse foi
o maior assalto do século. Isso nós nunca vamos esquecer. Como
resultado disso milhões de equatorianos buscaram outro destino. Hoje é
uma alegria ver milhares retornando, mas esta foi uma experiência muito
sentida.
O que estamos debatendo é totalmente invisibilizado pelas agências
internacionais. Essa discussão e o êxito dos programas sociais são pauta
na imprensa equatoriana?
Este é um tema muito importante e atual no mundo contemporâneo, que é
como os Estados modernos, enquanto representantes da sociedade e que
devem trabalhar pelo bem comum, encaram os grandes poderes, o poder do
mercado, o poder financeiro, mas também o poder midiático. Creio que em
relação a isso a proposta do presidente Correa é contundente e justa.
Não é porque uma família ou grupo de pessoas tenha adquirido a
capacidade econômica de comprar um canal ou um jornal que esta imprensa
tenha o direito de colocar-se acima dos mecanismos democráticos de
eleição e incidir na política de um país. E esse é o grande tema, a
questão de fundo.
A mídia tem sido e é um poder muito importante, um poder oculto, que não
segue necessariamente as regras do jogo democrático e que, através de
seus canais de comunicação, acostumaram-se a impor as agendas políticas,
econômicas em nossos países. No caso do Equador, isso acabou. Tem muito
poder ainda, porém já não colocam e tiram presidentes, não demarcam a
agenda do país, não tem o grau de influência que tiveram no passado
durante outros governos, porque eram parte destas elites que governavam
em nome da liberdade de expressão.
O Equador tem uma história especial em relação a isso, pois não tivemos
meios públicos no início da formação dos nossos meios de comunicação,
como foi o caso da Argentina, onde o primeiro a surgir foram os meios
públicos.
Nós tivemos basicamente meios privados e agora com o governo da
Revolução Cidadã é que os meios públicos ganham impulso. Pela primeira
vez temos um canal público, um jornal público, uma rádio pública, que
fazem um contraponto à manipulação da informação. Este ministério só tem
boas notícias a dar para o país, é o Ministério da Inclusão Social e
Econômica, porém desgraçadamente nos queixamos de que as boas notícias
não são notícias para esses meios.
Infelizmente ainda há um desequilíbrio em favor dos meios privados que
negam informações que seriam alentadoras para a sociedade equatoriana, o
que além de tudo é uma mesquinharia porque para além do governo de
plantão, necessitamos nos reconstruir enquanto sociedade e as coisas
boas, as conquistas, toda esta luta contra a pobreza na qual este
Ministério é chave, muitas vezes não encontram eco nos meios privados.
Vantajosamente também há várias outras formas de comunicação: investimos
muito no diálogo social, direto com os cidadãos, com os meios locais, o
que nos permite que a cidadania conheça diretamente a obra do governo.
Este é um governo que se comunica diretamente com as pessoas. Talvez
esta condição de desequilíbrio com os grandes meios privados nos tenha
dado esta grande vantagem: nos levou pelos caminhos da verdadeira
comunicação alternativa com o nosso povo.
Nesta comunicação direta, qual o papel dos gabinetes itinerantes?
Todos estamos em gabinetes itinerantes a cada três semanas. Há muito
trabalho desconcentrado nos territórios, o que faz com que os cidadãos
tenham canais de comunicação muito mais próximos aos ministérios, às
autoridades, que somos pessoas simples e a pé, como digo, porque somos
outro tipo de governo. Queremos ser um governo cidadão, honrar este
nome, e sempre estar muito próximos às pessoas. Assim a população sente
que o governo não é outra coisa senão a sua representação desde a
política pública.
O presidente Correa tem dito muito claramente e creio que tem razão: Há
um Equador de antes e depois. Os equatorianos recebem todos os sábados
um informe do que se tem feito ao longo da semana. Isso é uma pedagogia
até o povo, onde o presidente explica grandes e complexas decisões
econômicas ou estratégicas de maneira bem simples nas três horas que
dura o “Enlace Ciudadano”. Fez isso desde o primeiro dia de governo e já
estamos no 345º Enlace. Todos os sábados conta o que faz, onde esteve,
com quem se reuniu, o que comeu, falando sobre as grandes decisões que
tem de tomar. O mesmo fizemos nós, ministros, em outro nível e as
pessoas vivem a experiência de um governo muito mais próximo.
Por isso, embora enfrentemos uma campanha muito pesada, de muita
desinformação, os avanços são evidentes e as pessoas se manifestaram com
absoluta nitidez. Poderiam ter se posicionado apenas em favor do
presidente e não da Assembleia, pois tentou se vender a ideia de que era
necessário eleger parlamentares da oposição para fazer um contrapeso,
mas houve uma compreensão de que precisamos uma Assembleia par respaldar
os avanços, daí termos eleito a grande maioria. Isso diz muito de como o
povo está compreendendo este processo, de quanto quer que ele seja
irreversível. Assim estamos construindo um país inclusivo, que
representa a todos.
Como se dá a integração com os demais ministérios, o trabalho conjunto?
Esta é uma mudança muito importante que o presidente vem desenhando.
Somos nove ministérios coordenadores, articulando a gestão governamental
em nove grandes campos. Somos um gabinete setorial, todos os
ministérios estamos agrupados: educação, saúde, crianças, migrantes,
trabalhadores, moradia e desenvolvimento urbano. Dentro de um conceito
setorial temos uma agenda comum que trabalha todas as inter-relações,
como o combate à pobreza, por exemplo.
Este não é um tema do bônus de desenvolvimento humano, é uma alavanca
para a equidade, para a construção de igualdade de oportunidades, o que
tem a ver com o acesso à educação básica desde o início da vida para
romper com as condições estruturais de pobreza. O acesso à saúde: as
pessoas que recebem o bônus têm duas obrigações de co-responsabilidade:
matricular seus filhos na escola pública e fazer, no mínimo, duas
visitas a uma unidade de saúde.
Então não é uma dádiva, é um direito com uma corresponsabilidade. Desta
forma o meu trabalho é muito imbricado com o do Ministério da Saúde e
com o da Educação, para ir acompanhando as famílias neste processo de
erradicação da pobreza das novas gerações. Acompanhando não só os
jovens, as crianças, mas todo o ciclo da vida: os adultos, os idosos, as
pessoas portadores de deficiência. Levantamos todos esses dados também
para analisar como está o direito à moradia e todo o trabalho das áreas
sociais.
Ou seja, os êxitos que estamos conseguindo, como o de que nos últimos
seis anos um milhão de equatorianos tenham saído da linha da pobreza,
não é obra de um ministério, mas de toda uma política social integrada.
Da mesma forma, os ministério de âmbito produtivo têm um conselho de
produção, de política econômica, de segurança, talento humano – que
envolve educação básica, superior, em centros de formação e
qualificação.
Então o presidente governa a gestão pública através de nove ministros
coordenadores de uma forte Secretaria de Planificação, que é uma outra
grande mudança. Não há apenas a programação da política pública, que era
definida em termos de atividades e investimentos, nosso Plano de Bem
Viver se formula por objetivos, quer dizer, não há apenas somente a
planificação de cada ministério, mas a coordenação dos objetivos
governamentais aos quais cada um de nós aporta dentro de uma lógica de
trabalho integral e muito articulado.
Superamos assim a dispersão que havia no velho estado neoliberal onde os
ministérios eram basicamente administradores ou programadores de ações
sempre debilitadas. O presidente tem muito orgulho deste desenho
coletivo, de planificação integral, de trabalho em equipe, porque
realmente otimiza a política pública.
Como está a questão da seguridade social?
Este é um dos méritos do esforço do Equador: combater a pobreza fechando
as brechas da desigualdade. Aí entra a questão da geração de emprego
digno. O presidente chegou inclusive a defender que entre as perguntas
da consulta popular estivesse o fato de que fosse um delito penal o fato
da não vinculação dos trabalhadores à seguridade social. Porque aqui
isso era negado por muitas empresas.
Havia muitos empregados domésticos a quem seus patrões simplesmente não
pagavam a seguridade social, barrando o acesso a esse direito básico.
Graças ao apoio popular, que disse um sim rotundo na consulta, agora
esse é um delito penal e milhares de trabalhadores recuperaram esse
direito, contando com a proteção do seguro social. Foram gerados mais
empregos, mas dignos, em boas condições, não mais precários ou
terceirizados. A Constituinte nisso foi bastante radical: eliminou a
terceirização. O presidente tem uma filosofia bem clara, para nós vem
primeiro o trabalho, depois o capital. Para essa revolução o ser humano
está em primeiro lugar.
O Equador utiliza dois conceitos: o do salário mínimo e o do salário digno. Explique o seu significado.
Esta é outra mudança bem interessante. Antes as empresas declaravam sua
mais-valia, que era posteriormente repartida entre os trabalhadores.
Entre as mudanças normativas importantes está o de que nenhuma empresa
redistribua essas ganâncias sem antes haver assegurado um salário digno.
Hoje o salário básico está em em 329 dólares e o salário digno está em
351. Vamos chegando a este salário com a repartição dos lucros, porque
não é justo que acionistas, empresários e trabalhadores recebam a
participação nos lucros e resultados sem antes garantir o salário digno.
Estamos realmente orgulhosos de que o aparato produtivo equatoriano vai
melhorando a qualidade de vida das pessoas porém com trabalho decente,
com direitos sociais.
Uma última mensagem ao Brasil e aos brasileiros.
Creio que uma das conquistas deste novo tempo que estamos vivendo na
América Latina é que começamos a nos olhar mais, a nos conhecermos
melhor. O Equador já não olha mais somente para o Norte, creio que olha
muito mais ao Sul. Nossa participação ativa na UnaSul, no Mercosul, na
Celac, nas instâncias que estão sendo criadas para fortalecer a
verdadeira integração latino-americana, com mecanismos que nos permitem
conectarmos e conhecer cada vez mais as experiências positivas desta
rota favorável aos nossos povos. São lutas históricas de cada um dos
nossos países que estamos resgatando.
Olhamos cada vez mais de perto a experiência brasileira. Para o Equador,
a luta que o Brasil tem feito contra a pobreza com o presidente Lula e
atualmente com a presidenta Dilma são uma referência. Seria interessante
que o Brasil também pudesse conhecer melhor a experiência deste pequeno
país andino, que também está na mesma luta e esforço para construir um
país que represente a todos os equatorianos, uma Pátria próspera. Somos
uma pequena potência turística porque temos todos os climas, além de
maravilhas como Galápagos. Queremos que tudo isso potencialize um
desenvolvimento equilibrado em Bom Viver para todos. Alguns dizem que o
modelo equatoriano é um laboratório destas iniciativas e gostaríamos
muito de que o povo brasileiro as possa conhecer.